segunda-feira, 30 de junho de 2014

SOBRE DAIMON, DESTINO, TEORIA DA SEMENTE DE CARVALHO...

Psique - by Rosan


SOBRE DAIMON, DESTINO, TEORIA DA SEMENTE DE CARVALHO...

Daimon (em grego), gênio (em latim) e, em termos mais modernos, também anjo, alma,
 paradigma, imagem inata, estrela-guia, visão, caráter, destino, gêmeo interior,
 fruto do carvalho, companheiro eterno, protetor, vocação do coração, chamado...

Essa multiplicidade e essa ambiguidade são inerentes ao próprio daimon,
enquanto personificação de um espírito que, na psicologia grega,
era também o destino da pessoa.
Cada qual carregava seu destino.
O destino era o gênio particular que acompanhava cada indivíduo.

O daimon, no mundo antigo, era uma figura do "outro mundo",
nem humana, nem divina, algo entre essas duas esferas,
de uma "região intermediária", à qual a alma também pertencia.

O daimon era mais uma realidade física intima, do que um deus.
Era uma figura que podia aparecer num sonho, ou enviar sinais como pressagio, como palpite.

"Caráter é destino" (fragmento de Heráclito) vincula o modo de vida
ao desempenho da pessoa.

O foco egocêntrico do humanismo nos faz achar que o daimon, tendo nos
 escolhido para habitar, interessa-se por nosso destino...
Mas, e o destino dele?
(que também é o nosso...)

Talvez a tarefa do homem seja alinhar seu comportamento às intenções dele, 
agir de acordo com ele, por ele?
O que fazemos na vida afeta nosso coração, nossa alma
e interessa ao daimon.

Formamos a alma com nosso comportamento, pois a alma não chega pronta do céu.
É apenas imaginada lá, um projeto incompleto 
tentando baixar...

O daimon torna-se a fonte da ética humana, e a vida que
é alegre, a vida que é boa:
aquilo que os gregos chamavam de eudaimonia...
(eu = harmonia; daimonia = que pertence ao daimon),
ou seja, uma vida vivida em harmonia com o daimon.

A teoria do fruto do carvalho sustenta que cada pessoa tem 
uma singularidade que pede para ser vivida 
e que já está presente antes de poder ser vivida.

O fruto do carvalho costuma ser obsessivo...

(NOTAS: O Código do Ser - James Hillman, Objetiva, 1997)

Pode-se concordar com Hillman, ou não, mas é um livro que deve ser conferido...

Para mim, o daimon se apresentou na metanoia,
como vocação do coração, um chamado...
Um furação que sacudiu minha vida, 
devastou meu "mundinho seguro e previsível" que, porém,
tinha se tornado estreito, estreito demais...

Segui os sinais...
Não de forma fatalista, como um "destino" traçado desde o começo,
mas sim como uma segunda oportunidade de descobrir 
meu potencial vocacional ainda não vivido e que resolvi acolher...

A coragem veio, apesar do medo, 
pois eu tinha uma sensação interna de "ou vai ou vai"...
Não me arrependo, muito pelo contrário...
Hoje não consigo nem imaginar minha vida de outra forma...

Não saberia dizer com clareza SE
fui eu que acolhi o chamado do daimon  
ou se foi ele que, obsessivamente, acabou finalmente por ser ouvido
e levado em consideração...

Mas, nesta altura, isto já não tem a menor importância...
As duas coisas se fundem numa só...

Rosanna Pavesi/Junho 2014




sexta-feira, 13 de junho de 2014

SOBRE O NUMINOSO...

Sem Título (by Rosan)


SOBRE O NUMINOSO...

Em 1937, Jung escreveu sobre o numinoso como:

"(...) Uma instância ou efeito dinâmico não causados por um  ato arbitrário da vontade. 
Pelo contrário, ele arrebata e controla o sujeito humano, que é sempre antes
sua vítima do que seu criador.

O numinoso, indiferentemente quanto a que causa possa ter -
é uma experiência do sujeito (grifo nosso) independente de sua vontade...
O numinoso é tanto uma qualidade pertinente a um objeto visível
como a influência de uma presença invisível  que causa uma peculiar atenção da consciência".
(C.G. Jung - OC - Volume XI - par.6 - Vozes)


Desafia explicações, porém parece conter uma mensagem individual que,
embora misteriosa e enigmática, também é profundamente impressionante.

Jung percebia que a crença, consciente ou inconsciente, para confiar em um poder transcendente,
era uma condição prévia para a experiência do numinoso.

O numinoso não pode ser "conquistado" ...
O indivíduo pode somente abrir-se para ele... ou não...


É um confronto com uma força que encerra um significado ainda não revelado...
Jung via o confronto com o numinoso como uma característica de toda experiência "religiosa".

O numinoso, como todo fenômeno possui dois aspectos: (a) o aspecto luminoso
que arrebata, inspira, motiva... e  (b) o aspecto tenebroso, sombrio,
que possui o indivíduo, podendo torná-lo obsessivo e arrogante.
Tanto num caso, como no outro, pode nos desapropriar de nossa vida humana...
e, paradoxalmente falando, ele é ao mesmo tempo um anjo seráfico e um demônio,

in-humano...

É sempre um confronto subjetivo, portanto extremamente íntimo e pessoal pois,
como já disse Hillman, o íntimo e pessoal não é nossa história de vida,
mas sim como lidamos com nossos anjos e demônios...
Uma experiência religiosa, no sentido que nos reconecta com o mundo arquetípico,
uma revelação e, às vezes, uma iniciação...

A meu ver não é para os "eleitos", mas sim para os "necessitados"...

Seja lá qual for o motivo...

Quando isto ocorre, guarda-se o mistério no fundo do coração,
com muita humildade e nenhuma hybris...

Rosanna Pavesi/junho 2014