domingo, 31 de agosto de 2014

SOBRE SÍMBOLO...


Sem título - by Rosan
SOBRE SÍMBOLO...

A)    - SÍMBOLO SEGUNDO C.G. JUNG

“(...) Em minha concepção, o conceito de símbolo é bem distinto do simples conceito de sinal. 

Significado simbólico e semiótico são coisas bem diversas. 
A roda alada do uniforme do ferroviário NÃO é um símbolo da ferrovia, 
mas sim um sinal de que a pessoa integra o serviço ferroviário.

O símbolo, no entanto, pressupõe sempre que a expressão escolhida 
seja a melhor designação ou fórmula possível de um fato relativamente desconhecido,
 mas cuja existência é conhecida ou postulada.

(...) Enquanto um símbolo for vivo, é a melhor expressão possível de alguma coisa. 
E só é vivo enquanto cheio de significado. 
Mas, uma vez brotado o sentido dele, isto é, encontrada aquela expressão 
que formula melhor a coisa procurada, esperada ou pressentida 
do que o símbolo até então empregado,
 o símbolo está morto, isto é, só terá valor histórico.

Uma expressão usada para designar coisa conhecida continua sendo apenas um sinal 
e nunca será um símbolo. 
É totalmente impossível, pois, criar um símbolo vivo, isto é, cheio de significado, 
a partir de relações conhecidas.

(...) Na medida em que toda teoria científica encerra uma hipótese, 
portanto é uma descrição antecipada de um fato ainda essencialmente desconhecido, 
ela é um símbolo.

(...) Depende da atitude da consciência que observa se alguma coisa é símbolo ou não. 
É bem possível, pois, que alguém estabeleça um fato que não pareça simbólico à sua consideração, mas o é para outra consciência (símbolo individual X símbolo social X símbolo universal).

(...) O símbolo vivo formula um fator essencialmente inconsciente e,
 quanto mais difundido (universal) este fator, tanto mais geral o efeito do símbolo, 
pois faz vibrar em cada um a corda afim. (...) 

Como o símbolo vivo tem que conter em si o que é comum a um grupo humano bem grande 
para, então, atuar sobre ele, (o símbolo) deve abarcar exatamente o que pode ser comum a um grupo humano bem amplo. 
Jamais poderá ser algo muito diferenciado e inefável, porque isto só o entende uma minoria, 
mas tem que ser algo tão primitivo cuja onipresença esteja fora de dúvida.

Só quando o símbolo alcançar isto e o apresentar como a melhor expressão possível,
terá eficácia geral. 
Nisto consiste a eficácia poderosa e, ao mesmo tempo, salvífica de um símbolo socialmente vivo.

(...) Os puros produtos da consciência, bem como os produtos exclusivamente inconscientes, 
NÃO são de per si símbolos categóricos, mas cabe à atitude simbólica da consciência 
de quem observa atribuir-lhe o caráter de símbolo.

(...) O símbolo é sempre um produto de natureza altamente complexa, 
pois se compõe de dados de todas as funções psíquicas. 
Portanto (o símbolo) não é de natureza racional e nem irracional. 
Possui um lado que fala à razão e outro inacessível à razão (algo sempre “escapa...). 
A carga de pressentimento e de significado contida no símbolo afeta
 tanto o pensamento quanto o sentimento.”
(Fonte: Tipos Psicológicos – XI Definições – C.G. Jung – OC VI – par. 903-917 – Vozes, 1991).

Mais... 

“(...) O que chamamos símbolo é um termo, um nome, 
ou mesmo uma imagem que nos pode ser familiar na vida diária, 
embora possua conotações especiais além do seu significado evidente e convencional. 
Implica alguma coisa vaga, desconhecida ou oculta para nós.

(...) Assim, uma palavra ou uma imagem é simbólica quando implica 
alguma coisa além de seu significado manifesto e imediato. 
Esta palavra ou esta imagem têm um aspecto “inconsciente” mais amplo, 
que nunca é precisamente definido ou de todo explicado. 
E nem podemos ter esperanças de defini-la ou explica-la. 
Quando a mente explora um símbolo, 
é conduzida a ideias que estão fora do alcance da nossa razão.

Por existirem inúmeras coisas fora do alcance da compreensão humana
 é que frequentemente utilizamos termos simbólicos como representação de conceitos 
que não podemos definir ou compreender integralmente.
 Esta é uma das razões por que todas as religiões empregam uma linguagem simbólica 
e se exprimem através de imagens.
MAS este uso consciente que fazemos de símbolos é apenas um aspecto 
de um fato psicológico de grande importância:
o homem também produz símbolos, inconsciente e espontaneamente, na forma de sonhos.

Geralmente, o aspecto inconsciente de um acontecimento nos é revelado através de sonhos, 
onde se manifesta não como um pensamento racional, mas como uma imagem simbólica.
(...) Quando nos esforçamos para compreender os símbolos, 
confrontamo-nos não só com o próprio símbolo como com a totalidade do indivíduo que o produziu. Nesta totalidade inclui-se um estudo do seu universo cultural.

(...) Há símbolos naturais, distintos dos símbolos culturais. 
Os primeiros são derivados dos conteúdos inconscientes da psique e, 
portanto, representam um número imenso de variações das imagens arquetípicas essenciais.
Os símbolos culturais, por outro lado, são aqueles que foram empregados 
para expressar “verdades eternas” e que ainda são utilizados em muitas religiões. 

Passaram por inúmeras transformações e mesmo por um longo processo 
de elaboração mais ou menos consciente, tornando-se assim 
imagens coletivas aceitas pelas sociedades civilizadas."
(Fonte: O Homem e Seus Símbolos –1. – Chegando ao Inconsciente – C.G. Jung – Ed. Nova Fronteira – 10.a Edição.)

Pode-se considerar o símbolo como o produto da união de opostos, uma síntese,
 uma união dos contrários.  É o terceiro elemento, é algo novo... 
(vide Função Transcendente mais adiante).
Symbolen: o símbolo reúne aquilo que foi partido.

Ao lidar com material inconsciente (sonhos, fantasias, etc.), as imagens podem ser  tratadas   tanto semioticamente, como signos sintomáticos que indicam fatos conhecidos ou cognocíveis, como  simbolicamente, como expressão de algo essencialmente desconhecido.

A atitude simbólica é, no fundo, construtiva, no sentido de que dá prioridade à compreensão do significado ou propósito dos fenômenos psicológicos, em vez de procurar um explicação redutiva.

 É também importante averiguar o efeito do símbolo sobre o sentimento, suas impressões sensoriais, seu significado, seu conteúdo ideacional, o investimento de energia psíquica no mesmo...

De acordo com Jung, o símbolo possui a capacidade de transformar e redirecionar a energia psíquica, através daquilo que ele chamou de Função Transcendente. 
A Função Transcendente é, em sua essência, um aspecto de auto-regulação da psique 
e se manifesta, tipicamente, de modo simbólico. 
O símbolo é o produto desta Função, que é experimentada e vivenciada 
como uma nova atitude em face de si mesmo e da vida. 
Esta Função, cujo produto é o símbolo, é chamada de Transcendente 
porque vai além dos opostos, os transcende, 
nada tendo a ver com transcendência espiritual no sentido geral do termo.


B)    – SÍMBOLO PARA J. HILLMAN:

SIMBOLIZAR: Ver imagens simbolicamente, ou transformar imagens em símbolos.

SÍMBOLO: Contém, no mínimo, uma ideia principal e uma imagem. 
Ambos, a imagem e a ideia, têm em comum algo da experiência humana 
que é durável através do tempo.

 Ele (o símbolo) condensa um grupo de convenções que tende à universalidade.
 A convencionalidade no agrupamento similar de ideias numa imagem 
é a chave para o reconhecimento dos símbolos.

 O símbolo traz o profundo, o poder da história e da cultura, a generalidade do universo, 
a generalidade da experiência humana, verdades inexprimíveis e banalidades. 
Ser ele poderoso ou trivial depende da qualidade da imagem.

Segundo Hillman, há dois caminhos:

a)     Abordar as imagens via símbolos (simbolicamente):
quando, onde, generalidade, convencionalidade da imagem. 
O símbolo generaliza e descreve as possibilidades simbólicas, 
a fenomenologia dos arquétipos da psique objetiva.

b)     Abordar os símbolos via imagens, (imagisticamente):
o como, as particularidades, as peculiaridades da imagem. 
Na investigação sobre imagens, há uma valoração das imagens;
 todas as imagens se revestem de valor arquetípico.

 Qualquer imagem que é tomada como símbolo, tomada em sua dimensão universal, 
deixa de ser imagem.

 - Seria correto tratar o sonho como imagem?
A prática dos sonhos como imagens suspende nossa teoria que se baseia na abordagem simbólica. Pode ser vista como uma tentativa de voltar para o desconhecido
que até alguns anos atrás estava centrado no símbolo, “explorando” a imagem.

- Com os sonhos: 
totalidade presente na imagem; tudo que está ali é necessário/ tudo que é necessário está ali; 
fidelidade à imagem na sua apresentação precisa. 
(ex.: cisne grande, não pequeno, vivo, não morto, etc.).

- Dissolver a substância nominativa em metáfora: 
Ex. a “flecha” nomeando e/ou simbolizando uma coisa
 X 
a “flecha” como uma ação veloz e como qualificação multifacetada.

- NÃO traduzir a imagem em coisas e/ou conceitos. 
Ficar com a árvore, não com o conceito e/ou  o símbolo da árvore. 
(Notas:: Trilogia das Imagens: Image-Sense, Spring 1979; An Inquiry into Image; Further Notes on Image – James Hillman)


Do meu ponto de vista, tanto abordar as imagens via símbolos – os seja simbolicamente – 
quanto abordar os símbolos via imagens – ou seja imagisticamente – tem seu valor.

O universal e o particular... 
Posto que ambos estão presentes nos seres humanos e em nossos sonhos.  
Penso que o importante é saber quando estamos amplificando um símbolo 
e quando estamos particularizando uma imagem e fazer bom uso dos dois caminhos...

Por fim creio que, assim como com o símbolo, 
também nenhuma imagem, possa ser alcançada em sua totalidade. 
A vitalidade, o vigor psíquico de uma imagem e/ou de um símbolo reside justamente
 naquilo que foge, que escapa, que resiste a ser “des-velado” por completo... 
Que é o que intriga, instiga nossa curiosidade, que alavanca, que toca, que afeta...

QUE É VIVO...


Rosanna Pavesi/setembro 2014


domingo, 10 de agosto de 2014

CURTINDO UMA FOSSA...

Yellow Moonbird by Miró

CURTINDO UMA FOSSA...

Expressão antiga, caída em desuso...
Hoje ninguém mais tem uma fossa,
muito menos a curte...

Hoje, de cara, não estou triste ou acabrunhado,
hoje ninguém mais é "blue", ou tem "the blues", ou vivencia um "feeling blue"...
Não...
Hoje, de cara estamos deprimidos...
E logo buscamos um remédio que apague isto...
Não fica bem...

Arrumando papeis antigos, dei de cara com um "poema", também antigo - dos anos '90 -
época em que a fossa era curtida e evitava - talvez - outros estados mais densos e "negros"...

Compartilho...

Curtindo uma fossa...

Estou na fossa
Curtindo tudo que tenho direito 
Inclusive um Piazzola...
Me sinto sozinha, abandonada
Feia e sem rumo...

Entrei na fossa:
Pele opaca, olhos sem vida, cabelos sem viço
E o sorriso que custa a chegar
Os ombros pesados...

Não pinto, não leio, não faço
Só curto minha fossa!

Muitos cigarros, poucas palavras
Muito Piazzola...

Passividade total
Falta de ação, de vontade, de tesão
Nada interessa, nada prende a atenção...

Há somente esta fossa:
Escuridão total, inércia, apatia
Águas paradas, estagnadas
Insônia, angustia, cigarros
Não enxergo saída.
Estou curtindo uma fossa ao som de Piazzola...
(Rosan - Maio 1990)

A fossa passou... e aqui estou...
Tantos anos depois optei por compartilhar como uma forma de legitimar
este estado de alma, entre tantos outros...

Uma fossa podia ser "curtida"...
Uma depresssão não...

Rosanna Pavesi/Agosto 2014