sexta-feira, 20 de dezembro de 2019

REFLEXOÉS DE UMA ENERGÚMENA: SOBRE OS SONHOS QUE SONHAMOS ACORDADOS...

    

SOBRE OS SONHOS QUE SONHAMOS ACORDADOS...



Bienal de São Paulo - 2018


O post a seguir foi publicado em janeiro de 2012, um dos primeiros posts deste blog...

VEJA...
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Cidade de Sonho - Rosan

SOBRE OS SONHOS QUE SONHAMOS ACORDADOS...

 Gostaria de propor uma reflexão sobre os sonhos que sonhamos acordados, 
aqueles sonhos que tecemos para nos e nossa vida, 
a partir da frase de Mario Quintana que norteia esse blog, a saber:

       "Uma vida não basta ser vivida. Ela precisa ser sonhada..."

O que seria sonhar uma vida? 
Qual a diferença entre uma vida só vivida e uma vida vivida e sonhada?
A meu ver, se só viver não basta, também só sonhar  não basta...
Devemos sim sonhar, fazer planos, 
mas também precisamos ter a coragem de realizá-los, 
com a ousadia que nossos sonhos reclamam para si...

É sabido que os pais já tecem sonhos a respeito do futuro dos filhos até mesmo antes deles nascerem; 
de forma que, por certo tempo, "vivemos" dos sonhos que nossos pais projetaram sobre nos... 
Mas vamos crescendo e somos chamados a tecer nossos próprios sonhos, 
nos apropriar deles e construir nosso futuro.

Às vezes, nos deparamos com "uma pedra no caminho", 
como diria o poeta Carlos Drummond de Andrade...
Neste caso, é sabio não chutar a pedra, mas sim conversar com ela, 
perguntar a que veio e ter a coragem de escutar o que a pedra tem a dizer... 

Em seu livro O Valor do Amanhã  (São Paulo, SP, Edit. Companhia das Letras, 2005)
 Eduardo Giannetti retoma a fábula da Cigarra e da Formiga e escreve 
sobre a realidade dos juros e como ela se manifesta em todas as situações 
da vida prática 
nas quais os valores presentes e futuros medem forças em nossas escolhas e ações. 
O autor encerra seu livro com uma bela passagem sobre 
os sonhos que sonhamos acordados 
que transcrevo a seguir, por acreditar ser pertinente:

"... Os indivíduos perecem, mas a sociedade a que pertencem
 - obra aberta que une na mesma trama os valores dos mortos, dos vivos e dos que estão por vir - 
segue em frente. 
O passado condiciona, o presente desafia, o futuro interroga.

A previsão lida com o provável e responde à pergunta: O que será?
A delimitação do campo do possível lida com o exeqüivel, e responde à pergunta: 
O que pode ser?
E a expressão da vontade lida com o desejável e responde à pergunta: 
O que sonhamos ser?

As relações entre esses modos de conceber o futuro não são triviais: 
de um lado está a lógica: o desejável precisa respeitar a disciplina do provável e do possível. 
Mas, do outro lado, está o sonho. 
Se o sonho desprovido de lógica é frívolo, a lógica desprovida de sonho é deserta. 
Quando a criação do novo está em jogo, resignar-se ao provável ou ao exeqüível 
é condenar-se ao passado e à repetição.

No universo das relações humanas, 
o futuro responde à força e à ousadia do querer. 

A capacidade de sonho fecunda o real,
           reembaralha as cartas do provável 
e subverte as fronteiras do possível.

     "Os sonhos secretam futuro"

É bom lembrar que todas as invenções e descobertas da humanidade foram consideradas, 
em algum momento, impossíveis.....
De forma que, talvez, jamais se permitir sonhar acordado, ousar, apostar, arriscar, 
ou jamais se atrever, possa vir a ser a pior aposta possível.

E se algum sonho ou imagem de fantasia se apresentar, fique com ele/a...
Ele/a tem algo a lhe dizer, isso lhe diz respeito... 
Construa uma ponte entre a realidade psíquica e a realidade terrena pois, 
afinal, não são dois mundos separados, 
são apenas as duas faces de uma mesma realidade: a sua...


Quintana tinha razão... 
Por isto o nome do blog é Oficina de Sonhos, 
uma Oficina que se quer desejante e participante de "secretar futuro",
 assim como outros já fizeram no passado, o fazem no presente, 
cada qual a seu modo e, espero, continuarão fazendo no futuro...
           Sim: 
Uma vida não basta ser vivida. 
Ela precisa ser sonhada...


Rosanna Pavesi/jan.2012
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Fonte: WEB


O QUE MUDOU DE JANEIRO 2012 PARA DEZEMBRO 2019?

Na realidade brasileira muita coisa mudou...,
Que cada um faça  sua própria reflexão e considerações...

De minha parte, descobri que sou uma "energúmena"...
Explico:
Continuo acreditando na capacidade do sonho fecundar o real,
reembaralhar as cartas do provável, 
e subverter as fronteiras do possível....


Fonte: WEB

"Os sonhos, ah, os sonhos!
Uma amiga disse-me uma vez que sonhar é o mesmo que viver,
mas sem a grande mentira que é a vida. Talvez seja isso.
Talvez seja o contrário disso.Nem sei.

Acontece-me, por vezes, acreditar numa determinada ideia e 
no oposto dela com idêntica paixão,ou sem paixão nenhuma.

Nos útimos anos, aliás, venho perdendo cabelos e paixão.
Também venho perdendo ideias e ideais.
Talvez seja a velhice, talvez seja o nirvana.
O que você acha?"

(José Eduardo Agualusa em  A Sociedade dos Sonhadores Involuntários,
São Paulo: Planeta 2017).


Fonte: WEB



Um livro que é uma fábula política, satírica e divertida
que defende a reabilitação do sonho enquanto instrumento 
da consciência e da transformação...

De minha parte, devo dizer que meus cabelos ficaram brancos, mas ainda não os perdi...
Só me tornei uma energúmena de cabelos brancos...


Rosanna Pavesi/Dezembro 2019






quarta-feira, 24 de julho de 2019

ESPIRITUALIDADE: ORIENTE E OCIDENTE

Web


VELHO DITADO CHINÊS:

"SE O HOMEM ERRADO USA OS  MEIOS CERTOS,
OS MEIOS CERTOS FUNCIONAM DE MANEIRA ERRADA".

A paixão ocidental pelas disciplinas orientais tem frequentemente como resultado, 
um transplante artificial dos valores orientais para o solo ocidental, levando a uma espécie de
"materialismo espiritual".

Assim como a Hidra mítica, cuja cabeça cortada é sempre substituida por duas outras,
o ego perpetuamente idêntico a si mesmo, enfadonho e ansioso por transcendência, 
parece reemergir fortalecido e solidificado , como resultado direto da tentativa
metódica de diminuí-lo.

As pessoas irão praticar yoga, observar regimes estritos de dieta, repetir mecanicamente textos místicos - 
somente por causa da descrença em qualquer coisa boa que pudesse advir de suas próprias almas.
Ao invés de tomar emprestado negligentemente os tesouros do Oriente,
talvez devessemos - primeiro - tentar modelar nossas vidas a partir 
de nossas próprias raízes psíquicas?

O espírito enraizado no Oriente, uma vez arrancado e importado para o Ocidente
aqui chega privado de seu rico solo imaginal, esterilizado e cheirando a sándalo?



Paixão Silenciada - by Rosan


Segundo Roberts Avens (Imaginação É Realidade -  Vozes - 1993):

"Primeiro imaginação, depois espírito. 
Não há, entretanto, nenhuma espiritualização sem imaginação porque, no fim,
é a imaginação que "imagina" o espírito, mesmo quando o último finge 
ser independente da imaginação; 
pois a independência ou separação espiritual, como tudo o mais criado pelo homem, 
é um produto e uma fantasia da alma.

(...) A alma NÃO existe separada do que faz, 
incluindo suas configurações espirituais e materiais,
Nem é ela um conglomerado de espírito e matéria. 
A alma está  precisamente , absolutamente, francamente no meio (esse in anima).

Este é o mysterium tremendum et fascinans:
a alma, que estritamente não é, dota tudo o mais com ser e sentido.".



A Chuva - by Rosan


Fica a dúvida e a pergunta:

O homem ocidental faria qualquer coisa para evitar encarar sua própria alma?



WEB


Rosanna Pavesi/Julho 2019.

domingo, 3 de março de 2019

SOBRE A VELHICE...

by Paul Klee



SOBRE A VELHICE...

"A velhice é uma etapa de nossa vida que tem, como todas as demais,
aparências específicas, atmosferas e temperaturas próprias, prazeres
e necessidades peculiares.

Assim como todos os nossos irmãos mais novos, nós, os velhos de
cabelos brancos, também temos uma tarefas que dá sentido à nossa
existência. 
Ser velho é uma tarefa tão bela e sagrada quanto ser jovem, da mesma
forma que aprender a morrer e saber morrer são atributos tão valiosos
quanto quaisquer outros, desde que os encaremos com o devido respeito
pelo significado e pela santidade da vida.

O velho que odeia e teme a velhice, os cabelos brancos e a proximidade
da morte é tão indigno de representar sua categoria quanto o ser
jovem e vigoroso que odeia a própria profissão e sua atividade
diária, delas tentando esquivar-se.

Resumindo:

Para dar sentido à velhice e fazer jus à tarefa nela contida, é preciso
concordar com ela e dizer sim a tudo o que a ela diz respeito.

Sem este sim, sem essa entrega ao que a natureza exige de nós, nossos dias
- sejamos velhos ou jovens - não têm valor nem sentido,
e passamos a enganar a vida.


by Chico Stockinger


Pobre e triste, no entanto, é aquele que se entrega por inteiro a esses processo
degenerativo, sem ver que a velhice também tem seu lado bom,
suas vantagens, seus consolos e suas alegrias.

Quando penso neste lado belo e positivo da vida na velhice e me
lembro de que nós, os encanecidos, também possuimos fontes de
força, paciência e alegria que não têm qualquer importância na vida dos jovens,
(...) posso nomear, agradecido, algumas das dádivas que a velhice nos concede.



by G. Klimt


A que mais aprecio, dentre todas, é o acervo de imagens que guardamos
na memória após uma longa vida e que, com o declínio da atividade,
passamos a enxergar de uma forma nunca antes imaginada.

Silhuetas e perfis de pessoas que já se foram há sessenta ou setenta anos
continuam vivas para nós, nos pertencem, nos fazem companhia e nos
olham com olhos de vivos.

Casas, jardins e cidades que nesse interim desapareceram ou
sofreram grandes mudanças nos parecem exatamente como outrora;
montanhas e praias que décadas atrás admirávamos durante as viagens
continuam frescas e coloridas em nosso album de fotografias.



by Paul Klee



A visão, a observação e a contemplação se transforam cada vez mais
em hábitos e exercícios; sem que o percebamos, a atitude e o interesse
do espectador passam a dominar todo o nosso comportamento.

(...) Aqui, no jardim dos velhos, brotam flores que outrora
nunca nos preocupamos em cuidar.

(...) e quanto menores os nossos anseios por ação e participação,
maior nossa capacidade de ver e ouvir a natureza e o próximo."
(1952).

(Hermann Hesse em Com a Maturidade Fica-se Mais Jovem - Record - 2018).



by Rosan


Um dos textos mais singelo, poético e profundo que já li sobre
o tema...


Rosanna Pavesi/Março 2019







sábado, 23 de fevereiro de 2019

VER E SER VISTO

Fonte: WEB


VER E SER VISTO...

"(...) Em psicoterapia é crucial ver e ser visto, porque
isto oferece a possibilidade de conectar-se com o
que foi terrivelmente reprimido na cultura ocidental:

os deuses e deusas do ver e do tocar, do corpo:
Afrodite, Pã, Sileno.

Em última instância ver e ser visto incumbe mais
aos sentidos e não devemos esquecer Eros e Psiquê:
Psiquê necessita ver.


Fonte: WEB


Se o discurso limita-se aos ouvidos, a escutar,
excluem-se as múltiplas possibilidades do corpo
reprimido, a expressão do corpo físico, 
histórica e tão crucialmente reprimida.



by Vasco Prado



No que me concerne, analista e paciente têm que se ver
e ler as expressões do outro rosto,a outra máscara:
só assim há psicoterapia..

Se o analista é incapaz de aceitar a expressão de seu 
próprio rosto como uma forma de comunicação, é difícl
chamá-lo de psicoterapeuta:

é através do ver e ser visto que falar com o outro
significa falar com um ser humano;
de outro modo poderíamos acabar falando a uma "coisa".



Fonte: WEB



Antonio Machado diz assim:
O olho que vê não é
olho porque tu o vês.
É olho porque te vê.

Ver e ser visto é básico para o diálogo psíquico.
Não se trata apenas dos sentidos, é algo mais.

Quando chego a me dar conta de que não estou olhando os olhos
da pessoa com quem falo, detecto minha própria virgindade
atuando e tratando de me proteger dos olhos do outro.

Machado escreveu outro verso onde podemos compreender 
a mudança de pessoa à coisa:

A coisa que vês não é
coisa porque tu a vês.
Coisa é porque não te vê."

(Rafael López-Pedraza em Ártemis e Hipólito - Mito e Tragédia - Vozes - 2012).


 Fonte: WEB



O olho é olho porque te vê...
Quando não te vê, é coisa...



by Rosan




Rosanna Pavesi/Fevereiro 2019