quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

LENDAS SOBRE A ORIGEM DA ESPERANÇA...

Fonte: WEB


LENDAS SOBRE A ORIGEM DA ESPERANÇA...


"Na Índia, a esperança pertence a Maia, a grande Deusa, que nos tenta
com a roda da ilusão.

Como Maia, a esperança tece as incontáveis fantasias de nosso destino.
Somos apanhados numa teia de esperanças que é a vontade de viver,
experimentada como projeções rumo ao futuro.

Como emoção fundamental, a esperança de Maia seria o que a 
psicologia moderna chama de a função projetiva da psique
que nunca nos abandona enquanto formos vivos.,
induzindo-nos para a frente.



Fonte: WEB


No Ocidente, Pandora é a contrapartida de Maia.
As lendas de criação de ambas mostram paralelos.

Na Grécia, Zeus fez Pandora como uma estátua de tamanho humano,
pintada com a beleza, o primeiro "doce engano", dotada de virtudes
por vinte das divindades gregas.

Na Índia, a Grande Deusa tomou  forma como um produto
composto pelo panteão hindu reunido para salvar o mundo do desespero.



Fonte: WEB


Em outra  lenda, apareceu sob forma de Aurora; e então, como Sati,
foi modelada por Brahma na presença de vinte divindades para tentar Shiva,
afastando-o do isolamento ascético, de modo que o eterno jogo da vida
pudesse continuar, procriando e esfoliando sem cessar.

Associadas às deusas grega e hindu  estão todas as loucuras e vícios
da paixão humana e todas as energias criativas
(Shiva e Brahma; Prometeu, Hefesto,  Zeus).



Fonte: WEB


Pandora, em sua forma original, era representada por uma jarra ou vaso grande.
Esse vaso, tornou-se uma caixa na tradição posterior.

No vaso de Pandora, jazem escondidos todos os males do mundo.
Quando este foi aberto (e ele deve sê-lo inevitavelmente da mesma maneira
que Eva trouxe o Pecado ao mundo ao ceder à tentação do proibido)
voaram para fora todos os males, todos menos a Esperança.

A criação do mundo fenomenal da ilusão é semelhante na Grécia,
na índia e no Velho Testamento.


Fonte: WEB


A lenda de Pandora narrada por Hesíodo diz-nos que  a esperança é um dos males que estava 
no vaso e é o único que permanece aí dentro.

Fica escondida onde não é vista, ao passo que todos os outros males,
fantasias e paixões são as projeções que encontramos fora, no mundo.

Esses podem ser recapturados, integrando-se as projeções;
mas a esperança está dentro, ligada ao próprio dinamismo da vida.
Onde há esperança, há vida.
Nunca podemos confrontá-la diretamente, do mesmo modo que 
não podemos agarrar a vida, pois a esperança é o anseio de viver no amanhã,
O DEBRUÇAR INSENSATO NO FUTURO...

Vai, vai, vai..."


(J. Hillman em Suicídio e Alma - Vozes - 1993).






Onde a vida está, há esperança. E esta esperança é a própria vontade de viver,
o desejo de futuro - ou como a define o dicionário: "esperar com desejo".

Como poderíamos continuar sem ela? O que é o amanhã sem ela?

Como já disse Carlos Drummond de Andrade:

... como viver em termos de esperança?

... e que palavra é essa que a vida nunca alcança?




Fonte: WEB


Rosanna Pavesi/Dezembro 2018


terça-feira, 23 de outubro de 2018

ANÁLISE: VIDA, MORTE, TRANSFORMAÇÃO...

Sem título - by Rosan



VIDA, MORTE, TRANSFORMAÇÃO...


A vida e a morte chegam ao mundo juntas:
os olhos e as órbitas que as contêm nascem no mesmo momento.

No momento em que nasço tenho idade suficiente para morrer.
À medida em que vivo estou morrendo.
Entra-se na morte continuamente, não apenas no momento da morte conforme definida 
legal e medicamente.
Cada evento de minha vida contribui para minha morte
e construo minha morte à medida que prossigo, dia após dia.

A posição contrária também se segue, logicamente:
qualquer ação contrária à minha morte, qualquer ação que resista à morte,
fere a vida.

A vida e a morte se contêm mutuamente, 
completam-se reciprocamente,
são compreensíveis apenas se colocadas uma em relação à outra.


Sem título -- by Rosan




ANÁLISE
MORTE E TRANSFORMAÇÃO...

Quando nos perguntamos porque toda análise  defronta-se tão frequentemente
e em tal variedade com a experiência da morte, constatamos que, primeiramente,
a morte aparece a fim de dar lugar à transformação.

A flor murcha em volta de sua haste intumescida,
a cobra perde sua pele
e o adulta livra-se de suas maneiras infantis.


Sem título - by Rosan


A força criativa mata ao produzir o novo.
Cada perturbação e desordem chamada neurose pode ser vista
como uma luta de vida e morte na qual os contendores estão mascarados.

O que é chamado de morte pelo neurótico,
basicamente porque é escuro e desconhecido, 
é uma nova vida tentando irromper na consciência;
o que ele chama de vida, pelo fato de ser familiar, nada mais é do que
um padrão moribundo que ele tenta manter vivo.


Sem título - by  Rosan



A experiência da morte destrói a ordem antiga,
e, na medida em que a análise prossegue.
a análise significa morrer...

Talvez o medo de começar uma análise toca nesses terrores profundos
e o problema  fundamental da resistência não pode ser encarado superficialmente.

Sem uma morte para o mundo da ordem antiga,
não há lugar para a renovação.

É ilusório esperar que o crescimento seja apenas um processo aditivo
que não exige nem sacrifício nem morte.

A alma favorece a experiência da morte
para introduzir a mudança...



Catavento - by Rosan


(James Hillman - Suicídio e Alma - Vozes - 1993).


Nada tenho a acrescentar....


Rosanna Pavesi/Outubro 2018



domingo, 1 de julho de 2018

PSICOLOGIA E ALMA...

Lua Cheia - by Rosan


PSICOLOGIA PROFUNDA E ALMA...

"A psicologia profunda redescobriu a alma e colocou-a no centro de suas explorações.
Sob a pressão da psicologia acadêmica, porém, corre o risco de perdê-la de novo.

Ela tem sido mais ou menos mantida fora das acadêmias da psicologia "oficial".
Para aí entrar, exige-se-lhe que apresente seu ponto de vista, sua linguagem
e suas descobertas.

Exige-se-lhe que prove , por métodos experimentais,
seus achados clínicos.
Ela deve traduzir a compreensão clínica na linguagem da explicação científica.
Em resumo, o preço da admissão é a perda da alma.



Fonte: WEB


Talvez, a psicologia profunda seja a pedra que os construtores
da academia rejeitaram...



C.G. Jung - Fonte: WEB


Pode ser que um dia tenha que se tornar a pedra fundamental
de qualquer psicologia verdadeiramente científica, porque
a compreensão da natureza humana deve começar pela alma e usar
os métodos que melhor se adaptem ao objeto de estudo.

Psicologia significa "logos da psique", a fala, o discurso da alma.
Como tal, é necessariamente psicologia profunda, já que - como vimos acima -
a alma refere-se o interior, ao profundo.
E a lógica da psicologia é necessariamente o método de compreensão
que fala sobre a alma e lhe dirige a palavra em sua própria língua.



Prenúncios  - by Rosan


Quanto mais profundamente a psicologia puder ir em sua compreensão,
isto é, em significados interiores universais expressos pela linguagem arquetípica
de "falares"  míticos, tanto mais precisa cientificamente será ela 
e tanto mais alma terá..."

(J. Hillman em Suicídio e Alma" - Vozes, 1993)



La Luna - by Rosan


Nem tudo que é escuro é necessariamente reprimido...

Quando o analista não permanecer inteiramente com a alma,
estará traindo sua vocação e seu analisando...



Rosanna Pavesi/Julho 2018

sábado, 9 de junho de 2018

"SUICÍDIO E ALMA"...

Vozes - 1993


SUICÍDIO E ALMA

Escreve J. Hillman no Prefácio à Edição Brasileira:

"... há aspectos sociológicos, climáticos e culturais no assim chamado
"problema do suicídio" variando de lugar para lugar, de nação para nação. 

Mais fundamental, porém, é o fato de que o suicídio é inerente à natureza humana em toda parte -
cada um de nós tem opção de pôr fim à vida que vive;
e o suicídio é altamente especifico em cada indivíduo -
cada um de nós contempla o ato em seu próprio estilo.

O fato de a "taxa de suicídio" ser alta em certo País e baixa em outro,
mantém nossa  mente enredada em fascinações estatísticas, o que não nos diz absolutamente nada
sobre esse impulso humano e o papel específico que desempenha
na alma de um determinado indivíduo.

Dados sobre o suicídio são de todo irrelevantes no momento de se contemplar a  morte
ou quando tentamos compreender a partir do interior o ato suicida
de um paciente, de um professor, do irmão, do amado, de um jovem...



J.Hillman


O que se busca é esta compreensão a partir de dentro,
um método para uma investigação psicológica genuína, que supere moralismos religiosos
e diagnósticos psiquiátricos.
(...) Da compreensão de uma questão essencial - aquela que Camus disse ser a ÚNICA questão -
a possibilidade de ser pôr fim à própria vida.

E então:
o que quer a alma ao imaginar e até realizar esta possibilidade?

Não o caráter nacional ou as estatísticas atuariais dos suicídios,
não a classificação de bilhetes suicidas por idade,
status sócio-econômico e educacional,
não  os vários modos de auto-destruição conforme a religião,
a época do ano, as preferências sexuais e os regimes alimentares dessas "vitimas",
nem sequer seus "motivos" e "perfis", - mas o que quer a alma
ao apresentar à mente esta ideia inominável e à vontade a determinação de executá-la?

Pois esta é a questão - e é sempre a mesma pergunta qualquer que seja o tema
(casamento ou divorcio, aborto ou maternidade, segurança ou liberdade):
- o que quer a alma?"



Fonte: WEB

Para a Sociologia, o suicídio é um fenômeno sociológico estabelecido.
Deve ser prevenido e/ou combatido: retorno ao grupo.

Para  o Direito é um crime: não matarás.

Para a Teologia  é pecado (não matarás) e um ato de orgulho e rebelião.

Para a Medicina trata-se de defender a vida e promovê-la, a vida orgânica, a vida do corpo.

A ALMA: a alma e o corpo podem apresentar exigências conflitantes.
Segundo Hillman, é na alma que se deve procurar a justificativa para um suicídio.
O suicídio afirma a realidade independente da alma, sendo que a alma não é um conceito,
é um símbolo...

Indaga ainda Hillman:

"Talvez a morte orgânica tenha poder absoluto sobre a vida
apenas quando não se permitiu a morte no seio da vida?".

Um livro publicado pelo primeira vez há mais de 25 anos, 
que continua instigante a cada nova leitura..






Rosanna Pavesi/Junho 2018

domingo, 15 de abril de 2018

AS PAIXÕES HUMANAS...





                                                                       Sem título - Fonte: WEB


AS PAIXÕES HUMANAS...

Uma pequena história leve, despretensiosa e bem humorada, - aparentemente anônima -  que,
como o própria autora diz,  ela emendou, remendou e enfeitou um pouco
e que agora é "nossa"...


"Certo dia as Paixões Humanas se reuniram para brincar...

Depois que o Tédio bocejou três vez
porque a Indecisão não chegava a conclusão alguma
e a Desconfiança estava tomando conta de todos,
Loucura propôs que brincassem de esconde-esconde.


By M. Rothko


A Curiosidade quis saber todos os detalhes do jogo,
e a Intriga começou a cochichar com os outros, dizendo que
certamente alguém iria trapacear.


By M. Rothko


O Entusiasmo saltou de contentamento e convenceu
a Dúvida e a Apatia, ainda sentadas num canto, 
a entrarem no jogo.


By M. Rothko


A Verdade achou que isso de esconder não estava com nada,
a Arrogância fez cara de desdém, pois a ideia não tinha sido dela,
e o Medo preferiu não se arriscar:
"Ah, gente, vamos deixar tudo como está",
e como sempre perdeu a oportunidade de ser feliz.


By M. Rothko


A primeira a se esconder foi a Preguiça, deixando-se cair no chão
atrás de uma pedra, ali mesmo onde estava.

O Otimismo montou no arco-íris, 
e a Inveja se ocultou junto com a Hipocrisia, que sorrindo fingidamente
atrás de uma árvore estava odiando tudo aquilo.


By M. Rothko


A Generosidade quase não conseguia se ocultar porque era grande
e ainda queria abrigar meio mundo,
a Timidez ficou paralisada pois já estava mais do que escondida em si mesma,
a Sensualidade se estendeu ao sol num lugar bonito e secreto
para saborear o que a vida lhe oferecia,
porque não era nem boba nem fingida.


By M. Rothko

O Egoismo achou um lugar perfeito, onde não cabia ninguém mais.
A Mentira convidou a Inocência para mergulharem 
no fundo do oceano, onde a inocente acabaria afogada,
a Paixão meteu-se na cratera de um vulcão ativo,
e o Esquecimento já não sabia o que estavam fazendo ali.


By M. Rothko


Depois de contar até 99, a Loucura começou a procurar.
Achou um, achou outro, mas ao remexer num arbusto espesso
ouviu um gemido:
era o Amor com os olhos furados pelos espinhos.
A Loucura o tomou pelo braço e seguiu com ele,
espalhando beleza pelo mundo..

Desde então o Amor é cego e a Loucura o acompanha:
juntos fazem a  vida valer a pena..."


By M. Rothko


A autora ainda acrescenta:

"Mas isto não é coisa para os queixosos, os pusilânimes
e os demais rígidos, ou aqueles para quem a felicidade é um
bem proibido por deuses severos..."

((Lya Luft em Em Outras Palavras - Ed. Record - 2006).



Fonte: WEB


Concordo com a autora:
Não, não é mesmo...


Rosanna Pavesi/Abril 2018












terça-feira, 6 de março de 2018

SOBRE A VAIDADE HUMANA...


Imagem: by Rosan


A VAIDADE E A RAZÃO...

"(...) Quando a vaidade inunda a nossa razão, não há mais nenhuma reflexão 
ou interpretação dos fatos e de nossa condição
que não esteja contaminada com esta vontade de nos atribuirmos
significação especial, impar... (vaidade...)

(...) A preocupação das pessoas em se destacar e serem admiradas
transfere ao sistema social um poderoso e eficiente meio de controle
sobre a atitude e o modo de pensar de todas as criaturas.

Todos querem ser admirados e para isso terão que agir conforme os padrões em vigor;
as outras pessoas são os nossos juízes  e nós somos os que julgam os outros.
Todos somos juízes ao mesmo tempo e, de alguma forma,
passamos a nos temer reciprocamente;
e nos tememos porque podemos nos impor a dor da humilhação,
sensação desagradável associada a não sermos admirados,
a sermos desprezados como portadores de "defeitos" e modos de ser que não impressionam os outros.



Imagem: by Rosan


Não apenas os conceitos de "qualidades" e "defeitos" são construidos
desta forma primária e sem consistência;
tais "valores" se transmitem sem que os novos membros de um dado grupo social
tenham a oportunidade (e o tempo) de refletir sobre eles.

É fácil também perceber como estes "valores" são culturalmente determinados
e como são, até certo ponto, fáceis de serem alterados segundo os interesses de cada momento,
especialmente no mundo atual onde os meios de comunicação são incrivelmente eficientes.


A PALAVRA "IMPORTANTE"...


By A. Tapies - Fonte: WEB


Palavra usada para nos referirmos a pessoas que têm atividades "destacadas".

"Destacada" NÃO tem a ver com a efetivas contribuição para o bem estar da comunidade e,
no mais das vezes, significa ser muito conhecido, reconhecido por muitas pessoas,
olhado com admiração por milhares de criaturas anônimas, ser rico,
e desfilar com roupas e carros que chamam a atenção, ser tratado com deferência,
por ter poderes que instigam o oportunismo dos menos "favorecidos".



Imagem by Rosan



Segundo este critério de importância, ou seja,
ser conhecido, reconhecido, admirado e temido, um político corrupto
é uma criatura "importante".

Segundo o mesmo critério, um professor secundário que forma a mentalidade de novas gerações,
NÃO tem importância alguma.

As atividades "importantes" são bem remuneradas  
e as "sem importância" não o são; 
este pode ser um indicador para sabermos o que uma dada comunidade 
valoriza e admira e o que ela despreza.

Este exemplo nos mostra como o conceito de "importância" se afasta
da noção de utilidade social da função e se aproxima do fato 
de uma pessoa ser assim considerada apenas em virtude de ocupar um cargo pouco comum.

Em qualquer país do mundo há mais professores do que deputados ou senadores;
pelo modo de funcionar da razão contaminada pela VAIDADE,
deputado é mais importante do que professor...



Imagem by Rosan


Nenhum dos processos racionais fica livre da ânsia de se destacar,
de atrair olhares positivos de admiração; 
e também do pavor de atrair a ironia e a crítica que nos provocam a dor da humilhação."

(Flavio Gikovate em Vício dos Vícios - Um Estudo Sobre a Vaidade Humana - MG Edit.Associados - 2.a edição)


Velho Testamento (Eclesiastes):
Vaidade das Vaidades. Tudo é Vaidade.






De forma que, compreender tudo que pudermos acerca da vaidade e seus 
encantos e perigos parece ser essencial...


Rosanna Pavesi/Março 2018

sábado, 27 de janeiro de 2018

NOSSAS MUITAS FOMES...

By C. Portinari



NOSSAS MUITAS FOMES...

"Do meu cômodo posto de observadora - e o duro posto de cidadã, onerada de
altíssimos impostos, contas a pagar, perplexidade e insegurança, e otimismo
anêmico -, quero expandir o conceito de fome.

A fome, as fomes: de dignidade, a essencial.
De casa, saúde e educação, as básicas.
Mas - não menos importantes - 
a fome de conhecimento, de possibilidades de escolha.

Fome de confiança, ah, essa não dá para esquecer.
Poder confiar no guarda, nas autoridades, nos pais e no país, e também nos filhos.
Em nós mesmos, se nos acharmos merecedores.



by C. Portinari


Confiar em quem votei, e em quem não recebeu meu voto:
ser digno não é vantagem, é obrigação básica.
Andamos tão desencantados, que ser decente parece virtude,
ser honesto ganha medalha, e ser mais ou menos coerente merece aplausos.

Fome de conhecimento:
não é alfabetizado quem apenas assina o nome, 
mas quem assina o que leu e compreendeu.
De outro modo, perigo a vista.
Não cursa uma verdadeira escola quem dela sai para a vida
sem saber pensar, argumentar e discernir.

Informar-se é também ler: ler como se come o pão cotidiano...




By C. Portinari


Não creio que a violência que assola este país e nos transforma em ratos assustados
seja simplesmente fruto da fome de comida, mas da fome de auto-estima.

(...) Andamos acuados pela brutalidade que transcende os limites urbanos,
atingindo lugares bucólicos que antes pareciam paraísos intocáveis...

Teremos paz, esta nossa grande fome?

(...) Tudo começa, como dizem, em casa: 
desde quando ela era uma primitiva caverna, e nós uns trogloditas 
um pouco menos disfarçados do que hoje,
com fomes bem mais simples de satisfazer.".

(Lya Luft em "Em Outras Palavras" - Record 2006)
O Cão by Giacometti


O texto acima é de 2006... 
Nossas muitas fomes apontadas pela autora continuam fomes...
E a lista cresce...

Que cada um acrescente, às fomes apontadas acima,
suas próprias muitas fomes...

Rosanna Pavesi/janeiro 2018


Fonte: WEB








domingo, 14 de janeiro de 2018

SOBRE SER...

Fonte: WEB


NÃO SOU...

"Não sou a areia
onde se desenha um par de asas
ou grades diante de uma janela.

Não sou apenas a pedra que rola
nas marés do mundo,
em cada praia renascendo outra.

SOU...

Sou a orelha encostada na concha
da vida, sou construção e desmoronamento,
servo e senhor, e sou
mistério.

A quatro mãos escrevemos o roteiro
para o palco do meu tempo:
o meu destino e eu.

Nem sempre estamos afinados,
nem sempre nos levamos
a sério..."

(Lya Luft em Perdas e Ganhos - Record, 2003)


Sem titulo - Fonte: WEB



Rosanna Pavesi/Janeiro 2018

segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

UM POUCO DE SILÊNCIO...

Sem título - Fonte: WEB


UM POUCO DE SILÊNCIO...

" Nesta trepidante cultura nossa, da agitação e do barulho, 
gostar de sossego é uma excentricidade.

Sob a pressão de ter quer parecer, ter de participar, ter de adquirir,
ter de qualquer coisa, assumimos uma infinidade de obrigações.
Muitas desnecessárias, outras impossíveis, 
algumas que não combinam conosco nem nos interessam.

Não há perdão nem anistia para os que ficam de fora da ciranda:
os que não se submetem mas questionam,
os que pagam o preço de sua relativa autonomia,
os que não se deixam escravizar, pelo menos sem alguma resistência.


Fonte: WEB


O normal é ser atualizado, produtivo e bem-informado.
É indispensável circular, estar enturmado.
Quem não corre com a manada praticamente não existe,
se não se cuidar botam numa jaula: animal estranho.

Acuados pelo relógio, pelos compromissos, pela opinião alheia,
disparamos sem rumo - ou em trilhas determinadas -
feito hâmsteres  que se alimentam de sua própria agitação.

Ficar sossegado é perigoso: pode parecer doença.
Recolher-se em casa ou dentro de si mesmo,
ameaça quem leva um susto cada vez que examina sua alma.



Fonte WEB


^(...) O silêncio nos assusta, talvez por retumbar no vazio dentro de nós.
Quando nada se move nem faz barulho, notamos as frestas
pelas quais nos espiam coisas incômodas e/ou mal resolvidas,
ou se enxerga outro ângulo de nós mesmos.
Nos damos conta de que somos apenas figurinhas atarantadas 
correndo de um lado para o outro.

(...) Quem é esse que afinal sou eu?
Quais seus desejos e medos, seus projetos e sonhos?
No susto que essa ideia provoca, queremos ruído, ruídos...


Fonte: WEB


Silêncio faz pensar, remexe águas paradas...

(...) Mas, se a gente aprende a gostar de um pouco de sossego,
descobre - em si e no outro - regiões não imaginadas, questões fascinantes, 
e não necessariamente ruins.

(...) A quietude pode ser como uma chuva intensa e lenta,
tornando tudo singularmente novo:
nela a gente se refaz para voltar mais inteiro ao convívio,
às tantas frases, às tarefas, aos amores.

(...) Um pouco de silêncio bom para que eu escute o vento nas folhas,
a chuva nas lajes, e tudo o que fala 
muito além das palavras de todos os textos e da música 
de todos os sentimentos..."

(Lya Luft - Pensar é Transgredir - Record - 2004)


A Chuva - by Rosan


Sentada aqui, tranquila, escrevendo este texto,
com uma chuva mansa caindo lá fora, 
de repente me senti em paz, inteira, presente...

Todo final de ano, por festivo que seja,
carrega consigo agitação, barulho, correria...
Então o presente deste tarde veio como um balsamo...

Rosanna Pavesi/janeiro 2018