domingo, 28 de maio de 2017

SE EU PUDESSE...

Fonte: WEB


SE EU PUDESSE...

"(...) Até que ponto escolhemos aquilo em que acreditamos?
É difícil saber como é com cada um.

Às vezes tenho a impressão de que existem pessoas capazes de acreditar 
em praticamente qualquer coisa:
portam-se como consumidores a comprar ou descartar
no mercado das crenças aquilo em que acreditam -
ou pelo menos dizem acreditar, até para si mesmas -,
como se optassem por um programa na TV ou marca de dentifrício.

Como conseguem ser tão maleáveis?
Mas existirão pessoas assim, é o que me pergunto - 
gente com o dom de ligar ou desligar aquilo em que convém acreditar?
Francamente não sei...
Só o que sei - e disso estou seguro - é que - se tal dom existe,
eu definitivamente não o possuo.
Comigo não é assim... 



Fonte: WEB


Se eu pudesse escolher livremente aquilo em que acredito,
preferiria acreditar:
- que a Terra é o centro do universo, e não uma parte insignificante dele;
preferiria acreditar: 
- na existência de alguma forma de providência que zelasse 
pelos nossos destinos pessoais e coletivos;
preferiria acreditar:
- na perenidade da alma após a morte e na recompensa dos justos
e na punição dos atrozes;
acreditaria que basta crer na minha liberdade de escolha
para que ela de fato exista...

E não obstante - será preciso dizer? - não creio.


Sem título - by Rosan


A lista poderia seguir, mas nada acrescentaria.

O fato capital é simples: querer acreditar não basta.

Há uma fenda que separa aquilo em que se pode acreditar -
o domínio do crível - 
e aquilo em que se tem vontade de acreditar, ou seja,
aquilo em que se acreditaria, com sinceridade, alegria e boa-fé, se fosse possível.

Por mais que isso fira o nosso conforto espiritual
ou mortifique as pretensões humanas,
o desejo de acreditar não pode subjugar o impulso de investigar e descobrir..." 

(E. Giannetti em "A Ilusão da Alma - Biografia de uma Ideia Fixa"
Companhia das Letras - 2010)



Fonte: WEB


Assim como o autor, teria vontade de acreditar em diversas coisas,
a vida talvez seria mais fácil, ou mais simples?
Mas seria?
Não creio...


Rosanna Pavesi/Maio 2017

segunda-feira, 1 de maio de 2017

A CASCA QUE PROTEGIA O FRUTO...


 By G. Klimt


A CASCA QUE PROTEGIA O FRUTO...

"(...)  Curiosa vida tornou-se a minha...

Aos olhos do mundo, a monotonia de uma existência sem lustro
e um apego canino à rotina:
um cotidiano anódino de intermináveis leituras e caminhadas fúteis,
o andarilho solitário e sua sombra,
alheio a feriados e fins de semana.

                         

 Fonte: WEB


Eu seguia um ritual executado à risca, sem pressa ou obrigação:
a mesma sequência invariável de afazeres, hábitos e itinerários,
interrompida apenas pelos reclamos do corpo - 
o desconforto da fome e o chamado do sono.

Quem tivesse visto um só dos meus dias
poderia imaginar que tivesse visto todos.

E, no entanto, não teria visto nada...



Fonte: A Way to Blue


Aos olhos do mundo, admito, eu não pareceria mais que um relógio pontual 
inofensivo, marcando horas vadias em dias iguais -
um morto-vivo.

Mas aos olhos do mundo, afeitos à superfície do que acontece,
o que podiam ver?

Como suspeitariam da aventura de ideias e descobertas
que pulsava sob a epiderme daquela tépida rotina?



Fonte: A Way to Blue


Pois a realidade era que eu me sentia mais vivo 
em minha aparente semi vida, aferrado ao meu dia a dia de estudos e meditação,
do que quando parecia animadamente vivo aos olhos de todos,
rodopiando no carrossel dos desejos e ambições.  



 Fonte: A Way to Blue



Fiz da rotina ritualizada o meu escudo protetor -
o invólucro de um fervilhante miolo intelectual.

Disciplina espartana por fora,
vigor inquisitivo por dentro.

A casca protegia o fruto..."




(E. Giannetti em "A Ilusão da Alma - Biografia de uma Ideia Fixa"
Companhia das Letras - 2010)



Fonte: WEB

O livro na estante, na pilhas dos ainda não lidos - me chamou neste feriado...

Estranha coincidência?
Justo no feriado em que programei ficar em casa,
sem "fazer nada", a não ser comer, dormir, ler, pintar, caminhar...
retirar-me do mundo...
Como alguém que se dá um presente...

Uma ou duas vezes, em minha vida, já usei este recurso como um escudo protetor...
Sempre funcionou...
Saia do "retiro" calma, serena, fortalecida...

Hoje ainda faço de vez em quando,
não mais como um escudo protetor
mas sim como uma doce, suave e merecida pausa...




Rosanna Pavesi/Maio 2017