segunda-feira, 28 de agosto de 2017

O ALQUIMISTA...

Eros - by Rosan


Ontem, 27 de agosto, foi o Dia do Psicólogo...

Voltei atrás no tempo, a um tempo quando ainda não era nem psicóloga,
nem psicoterapeuta de abordagem junguiana...
Era, simplesmente, uma cliente em terapia...
Minha primeira vez, num momento muito difícil de minha vida,
quando a terapia fez toda a diferença do mundo...

No final da terapia, entreguei um caderninho ao meu terapeuta,
Um caderninho com alguns poemas que surgiram ao longo do processo...

Transcrevo aqui alguns deles, em homenagem ao trabalho silencioso,
discreto, profundo e humano de todos nós...


Psique - by Rosan


O ALQUIMISTA

Este homem não me amou, nem nunca me beijou, ou abraçou...
Me magoou, mas não fugiu ou abandonou..
Não me entregou, nem criticou, ou julgou...

Uma vez somente gritou, outra me censurou,
mas também me endossou...
Sua mão tremeu, sim, uma vez só...

Mas me olhou, me viu, me ouviu e silenciou.
Me olhou como pessoa, com aquele olhar estranho,
impiedoso e tão cortante, eficiente e arrogante, ou alegre e brincalhão...
Ás vezes tão profundo, preocupado,
às vezes um pouco ausente, ou irreverente mas, sempre,
com muita compreensão.

Me ouviu pacientemente, bocejou de vez em quando, 
disfarçou tranquilamente, mas estava ali, presente.
Me falou quando podia, quando eu lhe permitia...
Ás vezes com carinho, ou com ternura,
outras com ironia, compaixão ou alegria...

Me tirou do escuro e, em silêncio, me devolveu à luz,
me sacudiu, me ensinou, me emprestou sua energia...
Resgatou todo um passado, devolveu-me em poesia, mil palavras corriqueiras...

Dissolveu minhas mágoas, libertou minhas muitas lágrimas,
desmanchou meus muitos nós, acariciou meus pensamentos,
suavizou meus pesadelos...
Companheiro, sem querer, de uma viagem tenebrosa,
mas também maravilhosa...

Este homem me ajudou...



Sem título - by Rosan


A CONSULTA

Do que vou falar hoje?
Não sei por onde começar,,,
Nunca sei...

Nada mais é premente, nem urgente, 
tudo ficou para trás...
Falar do presente, o futuro do passado, o passado do futuro...
Enquanto eu falo, 
ele já se vai...

Falar do futuro?
O futuro não se fala, ele acontece...

Do que vou falar hoje?



by Miró


PESSOAS...

Todas as quartas-feiras, às dezoito e trinta,
encerrou...

Nas mesmas quartas-feiras, às dezoito e trintas,
outra pessoa, outros problemas...

Fumante ou não fumante?
Homem ou mulher?
Jovem ou coroa?
Pontual ou atrasada?
Chata ou interessante?

O que quer deixar para trás,
do que quer se libertar?
O que busca, pois sempre busca...
Será outra maluca?

No meio desta multidão,
o analista nunca sente solidão?




by Rothko


Rosanna Pavesi/Agosto 2017




quarta-feira, 16 de agosto de 2017

SOBRE MORALIDADE...

                                                                 Carl Gustav Jung - Fonte: WEB



SOBRE MORALIDADE...

A contribuição de Jung no campo da ética e da moralidade era do ponto de vista
de um analista e psiquiatra:
"Por trás da ação de um homem não se encontra nem a opinião pública
nem o código moral, mas sim a personalidade da qual ele ainda
é inconsciente" (CW 11, par.390)

Em outras palavras, o problema da moral se apresenta psicologicamente 
quando uma pessoa encara a questão de saber no que ela pode se tornar
em comparação com o que ela irá se tornar se determinadas atitudes
forem mantidas, decisões tomadas ou ações estimuladas SEM REFLEXÃO.


Sem título - by Dirce Schueler


Jung afirmava que a moralidade não é invenção da sociedade,
mas sim inerente às leis da vida.

É um homem agindo com consciência de sua própria responsabilidade moral
para consigo mesmo que cria a cultura, e não o inverso.


Fonte: WEB


Jung sugeria que era um princípio de individualidade inato que compele
toda pessoa a fazer julgamentos morais em concordância consigo própria.

Esse princípio, composto de uma responsabilidade primária para com o ego
por um lado, e - pelo outro - em relacionamento com as exigências supra-ordenadas do self
(no que uma pessoa pode se tornar) é capaz de fazer as mais arbitrárias
e penosas solicitações.

Estas parecem ter pouco ou nenhum sentido ou referência aos padrões do coletivo
e, contudo, mantêm um equilíbrio com a sociedade.
O resultado de tomar uma decisão consciente de capitular ou renunciar
(dar em sacrifício) uma posição do ego pode aparentemente trazer
uma satisfação exterior pouco pessoal e imediata,
MAS 
estabelece uma correção das coisas de forma psicológica;
isto é, "funciona", usando a expressão de Jung.

Ela restaura um equilíbrio entre forças conscientes e inconscientes.



by P. Klee - Fonte: WEB


Qualquer encontro com um arquétipo apresenta um problema moral.
Este se torna tanto mais difícil quando o ego é fraco e indeciso
em relação à atração numinosa exercida pelo próprio arquétipo.

O arquétipo do self pode vir a fazer exigências imperiosas e autoritárias.
O que Jung parece dizer é 

ser possível dizer um "não" consciente à autoridade do self;

também é possível agir em conformidade com o self.

Porém, tentar ignorar ou negar o self é imoral porque nega 
o único potencial de alguém para ser.

Estas ideias são compatíveis com a teoria básica junguiana dos opostos;
fundamentalmente,é o conflito entre os opostos que 
coloca o problema moral à personalidade...

(Fonte: Dicionário Crítico de Análise Junguiana - 
Andrew Samuels, Bani Shorter, Fred Plaut - Imago)



A Chuva - by Rosan


Sacrifício... Tornar sagrado...
O ato de renúncia é equivalente ao reconhecimento  de
um princípio supra-ordenado à consciência presente de um individuo...

Em algum momento da vida cada um de nós será eventualmente chamado ao sacrifício;
isto é, a renunciar a uma atitude psicológica apreciada, neurótica ou de outra natureza.
Em cada caso, é provável que a exigência seja maior que a de uma adaptação ocasional.
Uma parte essencial do preço que pagamos para sermos humanos...

Ao mesmo tempo, Jung sempre salientava a importância de mantermos uma 
atitude crítica e fazer "o possível" tão só...

Rosanna Pavesi/Agosto 2017

quinta-feira, 10 de agosto de 2017

A TEORIA DO FRUTO DO CARVALHO - (BY J. HILLMAN)

                                                       A ÁRVORE DA VIDA - by Rosan



A TEORIA DO FRUTO DO CARVALHO

Cada pessoa entra neste mundo atendendo a um chamado.
Esta ideia já está em "A República"  de Platão e, ao longo dos séculos, vem
recebendo denominações diferentes.
Os romanos denominavam este "chamado" de gênio
Os gregos usavam o termo daimon  para designá-lo.
Românticos, como Keats, acreditavam que este chamado vinha do coração.

James Hillman em seu livro  O Código do Ser (Objetiva - 1997), desenvolve a teoria
do fruto do carvalho que pode ser resumida conforme segue:

"Cada vida é formada por sua imagem única, uma imagem que é a essência
desta vida e a chama para um destino. Tal como a força do destino,
essa imagem age como um daimon  pessoal, um guia que se lembra
do seu chamado.

Os "avisos" do daimon agem de muitas maneiras.
daimon motiva. Protege. Inventa e persiste com obstinada fidelidade.
NÃO costuma ceder ao bom senso e muitas vezes faz seu portador
agir de forma que foge às regras, especialmente quando negligenciado ou contrariado.
Oferece conforto e pode puxar você para a sua concha, 
mas não tolera a inocência.
Pode fazer o corpo adoecer.
Está em descompasso com o tempo,
descobrindo todos os tipos de falhas, brechas e nós no decorrer da vida -
e dá preferência a essas coisas.
Tem afinidade com o mito, uma vez que é um ser mítico e pensa em termos míticos.


Noites Antigas - by Rosan


O daimon tem um pré-conhecimento - talvez não das particularidades -
porque não pode manipular os acontecimentos para fazê-los combinar
com a imagem e realizar o chamado.

Portanto, seu pré-conhecimento não é perfeito, mas sim limitado
à significação da vida na qual ele está encarnado.
É imortal, no sentido de que não pode deixar de existir,
nem ser morto apenas por explicações mortais.


Sem título - by Rosan

Tem muito a ver com sentimentos de singularidade, grandeza 
e com a inquietação do coração, sua impaciência, sua insatisfação, seu desejo.
Carece de seu quinhão de beleza.
Deseja ser visto, testemunhado, reconhecido,
particularmente pela pessoa que dele cuida.

É lento para se fixar e rápido para voar.
Não pode mudar seu próprio chamado supremo
sentindo-se ao mesmo tempo só e exilado, e em harmonia cósmica.

As imagens metafóricas são sua primeira língua inata, 
que fornece a base poética da mente, possibilitando que todas as pessoas
e todas as coisas se comuniquem por metáforas..."


Sem título - by Rosan


Esta teoria oferece uma visão mais libertadora de traumas infantis
e discute temas importantes como fatalismo, caráter, desejo,
influências familiares e, acima de tudo, vocação
este mistério que adormece na essência de cada ser humano.

Hillman não considera os seres humanos vitimas de uma educação familiar
ou de heranças genéticas. Também não oferece um guia  milagroso para
"curar" desajustes psíquicos.
Em vez disso, ele assinala a importância de que cada um procure 
descobrir o seu daimon, 
aquilo que já trouxe impresso em sua individualidade, disposto a se desenvolver.

Por fim, citando livremente uma frase de Jung: 
No fundo, somos importantes somente por aquilo que encarnamos
e se não o fazemos, nossa vida será desperdiçada...


A Pérola do Amor - by Rosan


Rosanna Pavesi/Agosto 2017