domingo, 9 de setembro de 2012

SABADO ECLÉCTICO...


(by A. Tapies)


Um sábado espremido entre o feriado de 7 de Setembro e o domingo...

Precisava comprar roupa, fui ao shopping...Encontrei o que queria... Me dei por satisfeita...

Na saída, em plena tarde, parei na calçada para fumar um cigarro...
Ali estava eu, bem longe, saboreando meu cigarro, e um senhor se aproximou...
Um tanto sujo, mal vestido...
Pensei comigo: ou vai me pedir dinheiro, ou vai me pedir um cigarro...
Mas não me afastei, fiquei alí parada, na calçada pública...
Ele olhou para mim, eu olhei de volta para ele...

Com um ar de interrogação nos olhos, e após certa hesitação, ele me dirigiu a palávra e  disse:
"Senhora, posso falar uma coisa?"
"Sim, claro" eu respondi...
Ele: "Sou morador de rua, como a senhora bem  pode ver, mas estou com dinheiro no bolso e fui até essa lanchonete aí (apontando), pedi um misto quente e pus a mão no bolso para pegar o dinheiro e pagar, mas aí a moçinha atrás do balcão olhou para mim e disse:
"Aqui não vendemos nem vinho, nem cachaça..."
Ele: "Mas eu só pedi um misto quente...Me virei e, envergonhado, sai da lanchonete..."

 Olhou para mim,como que para ver minha reação...
Eu fiquei quieta, só olhando para ele,  sem muito saber o que dizer...

Ele me perguntou: "O que a senhora acha disso?"
Eu, calmamente, olhando bem nos olhos dele, respondi:
"Para mim isto é discriminação..."

Talvez surpreso com minha resposta, talvez surpreso por alguém não ter tido medo de falar com ele, talvez surpreso por alguém se dispor ao ouví-lo, olhou de volta nos meus olhos e,
com ar e voz triste, disse:
"Eh, é isso aí... Desculpe senhora, e obrigado por me ouvir..."

E continuou o seu caminho...
Era um morador de rua...

Este homem não estava bebado, falava coisa com coisa, foi educado, mas estava sujo e mal-vestido...
Talvez quisesse comprovar, apesar das aparências, se ainda lhe restava alguma dignididade, se ainda alguém conseguiria vê-lo simplesmente como um ser humano, sozinho, com uma dúvida atroz na cabeça:

"Será que ainda sou gente?"...

Me  lembrou de alguns clientes que, às vezes, antes mesmo de falar seu nome, se qualificam pelo diagnóstico que receberam (sou PMD, tenho Toc, sou Borderline...) ou até mesmo pelo momento de vida que estão atavessando (estou desempregado, estou me divorciando, estou deprimido...),
 algo vergonhoso... 

Sujeitos sem nome, sem identidade, que se identificam ou com uma hipotética etiqueta que lhe foi colada ou com uma situação socialmente intolerável, que os tranforma em "indesejados e indesejáveis"...
Falharam, fracassaram, de alguma forma não são "normais""...

Fiquei triste, dolorosamente triste...


Rosanna Pavesi/setembro 2012


Um comentário:

Dra. Cristiane Grande Jimenez Marino disse...

Rosana,
Fiquei muito tocada com essa história, e principalmente com seu olhar sobre ela.
Bjs
Cris