A Árvore da Chuva (by Rosan)
ORFANATO PORTÁTIL
by Marcelo Montenegro
Fabiana Stambrio, colega e amiga, me "apresentou" este livro de poemas e...
foi amor à primeira, segunda e terceira vista...
Em tempos de profundidade superficial, uma profundidade profunda, singela,como toda verdadeira profundidade é, foi uma surpresa e um susto ao mesmo tempo...
No prefácio à primeira edição, Maurício Arruda Mendonça escreve:
...Visão poética e de vida, já que ele mantém a câmera do coração
atenta aos acontecimentos que povoam de sentido o cotidiano.
Orfanato, por causa do desamaparo das coisas que um dia amamos
e perdemos pela existência afora, objetos que se acumulam na lembrança
como quinquilharias, bugigangas, tralhas,
"tranqueiras líricas na velha caixa de sapato"
A sensibilidade de Montenegro é a do carinho pelos detalhes,
porque ele busca o gosto de existir na celebração do momento presente,
porque deseja captar fenômenos efêmeros e registrá-los velozmente
antes que se desmanchem e sejam velados pelo esquecimento...
E aí a gente se dá conta de que os poemas de Montenegro não são poemas.
São verdadeiros fotogramas...
E Tadeu Sarmento acrescenta:
... Ler os poemas de Marcelo Montenegro é contrair a culpa moral por não ter percebido o que estava bem diante dos nossos olhos...
Foi bem assim que me senti...
Na tentativa de redimir a culpa, mesmo que só em parte,
compartilho alguns poemas de Marcelo Montenegro...
(by A. Piza)
FISSURA
Passageiros da mesma fissura
eu e você
dentro do vento
Escondidos
no mesmo grão
de poeira
SUBSTÂNCIA
não há substância alguma na imagem que procuro
tampouco há discrição
ou dedos em riste
algumas músicas a gente nunca sabe se são alegres
ou se são tristes
do ponto exato
onde deram o nó
(by A. Piza)
MATINÉ
Às vezes saio do cinema
E me ponho a andar
Cartografias pessoas
Apenas olhar
Ter a leve impressão
De que a cidade está grávida
De um outro lugar
SINOPSE
Canetas que falham ao lado do telefone.
O baque das havaianas na escadaria.
O labor sigiloso de um poema.
Um gemido de geladeira
nalgum ponto perdido do dia.
Um copo que nosso brusco
e cômico malabarismo
evitou que se quebrasse.
(by A. Piza)
ALGO
Na travessia de tardes degoladas
a suprema confusão
de algum sentido - ainda
ou para sempre tosco.
Algo em mim que eu nem suspeito
amadurece mais um pouco.
GUARDANDO A TRALHA
Repara. Há sempre algúem
guardando a tralha. Tremendo a foto.
Aprimorando a tara.
Há um deus maluco embaralhando
as cartas.Uma banana quase preta
na fruteira. E o último gole
de cerveja em lata.
(by A. Piza)
MAIS:
Marcelo Montenegro, Orfanato Portátil, 2.a ed.- São Paulo: Annablume, 2012.
(Rosanna Pavesi/Maio 2013) |
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