Mistério é o oculto que dá indícios de si - e por isto constitui um mistério.
O que se esconde por inteiro não chega a se tornar um mistério porque dele não há nenhum vestígio.
O que se exibe por completo, esse não guarda nenhum mistério dentro de si.
Em todo mistério tem que haver o claro e o oculto:
a lembrança do inacessível que, guardando-se da luz, dá mostras de sua ausência.
No mistério, o inalcançável possui uma face visível que torna presente sua ausência, sem eliminá-la.
O mistério é o ausente-presente.
O ausente, isso é o fundamental em todo mistério, é indissociável do que se apresenta.
O oculto não constitui "um outro", separado do que se revela...
O oculto é o próprio que se mostra,
o ausente é o que se apresenta como ausência.
No mistério está sempre presente o inatingível, o ausente à percepção do pensamento.
O inaparente não é apenas a face oculta do aparente, mas é no próprio aparente:
os dois são como uma moeda em que uma face se prolongasse na outra sendo nela mesma.
O mistério está todo alí e, no entanto...permanece inatingível!
Talvez como a lua nova, que se oculta mantendo-se inteiramente no céu...e, nascente,
ainda indica nela a presença do manto da noite, compondo as duas
- sombra e luz - o mesmo círculo concluso.
Ou como o opaco da pérola, que brilha escondendo seu brilho...
Em todo mistério, descoberto e coberto são um no outro o mesmo
(sem jamais se igualarem)...
Essa é a essência do mistério:
ser descoberto no encoberto...
Mistérios não são desafios nem enigmas, não são imagens nem sombras projetadas,
Mistérios são a sombra luminosa de si mesmos!
Clareá-los significaria fazê-los desaparecer no oculto de si próprios.
Seria como iluminar uma pérola para esclarecer a origem de seu misterioso brilho.
A pérola não pode ser mais clara, óbvia em seu mistério,
do que já é - não tem nada mais a revelar.
Iluminando-a desaparece o mistério...e, com ele, o brilho da própria pérola.
Mistérios não se desnudam, nem se permitem desnudar-se.
Mistérios se auscultam, se descrevem, se indagam...se meditam:
mas não se desvelam...
Mistérios
são o brilho da pérola, as cores das asas do pavão, o esplendor do pôr-do-sol,
a linguagem do homem.
Misterioso é o ente, o real. O mundo...O ser..."
(Guy Van de Beuque em " Experiência do Nada como Princípio do Mundo"
Faperj-Mauad, 2004)
Um dos textos mais bonitos e instigantes que já li sobre o tema...
Poesia...
Só compartilho, nada tendo a acrescentar...
Rosanna Pavesi/Novembro 2014
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