O Bosque - by Rosan
AS VIRTUDES DA CAUTELA...
Trechos extraídos do belo artigo de James Hillman - com o mesmo título - publicado
originalmente em Resurgence - n. 213- August 2002.
"(...) Ao diminuir a velocidade e questionar os meios mais evidentemente eficientes,
a precaução incita inovações e experimentos.
Um convite a Hermes, o de mente mercurial, para testar maneiras previamente não imaginadas
de se chegar aos mesmos fins e que estejam de acordo com esses fins.
A necessidade causada pela cautela, na verdade, se torna a mãe da invenção...
Sou um psicólogo e, como tal, preciso oferecer um chão psicológico à cautela.
Três tipos de fundos de cena,
são particularmente interessantes de serem lembrados:
O primeiro é a máxima hipocrática: PRIMUM NIHIL NOCERE:
Antes de qualquer ação, ou plano de ação, antes de mais nada, considere o lado ruim antes do bom.
Considere os riscos ao invés dos benefícios.
Aborde os piores cenários possíveis e estenda na integra a noção de "fazer mal".
É importante lembrar que toda intervenção nos modos do mundo
sempre atrai uma sombra
e que a Terra tem suas próprias virtudes e forças, ou seja lembrar que
a natureza pode estar agindo de maneiras que nossa falta de precaução não nos deixa perceber.
A cautela hipocrática traz consigo um fundo de animismo antigo,
de respeito pela dignidade e poder dos fenômenos.
Solicita uma escuta atenta dos fenômenos...
O segundo é o daimon de Sócrates:
Em vários trechos dos escritos de Platão, Sócrates é descrito como alguém que se detém
diante de uma ação devido à intervenção de seu daimon.
Este daimon, espírito, anjo, voz interior, gêmeo invisível,
este "fator psíquico autônomo" (Jung), espírito cauteloso...
Segundo Sócrates, o espirito acautelador nunca diz a alguém o que fazer,
só o que não fazer...
Ele age unicamente como cautelar e fala de maneira peculiar:
não estatística nem cientificamente,
mas como anedota ou superstição, sintomaticamente como augúrios, pistas e sussurros;
até mesmo através de eventos corporais como espirros, bocejos e soluços.
O terceiro é o background endêmico das sociedades ocidentalizadas em qualquer lugar,
a depressão...
A depressão, quer da psique, quer da economia, é desesperadamente
temida nas sociedades ocidentalizadas e todas as medidas possíveis são mobilizadas
contra ela.
A pressão que sentimos, as drogas que tomamos, as expectativas que nutrimos
e os ditados da expansão econômica global,
são todas medidas anti-depressivas.
A precaução, desta perspectiva, tem pouco valor.
Sugerir cautela numa sociedade maníaca é entendido por ela somente como depressão e,
por isso, o princípio da cautela deve ser introduzido em termos maníacos,
como inovador, progressista, penetrante, visionário
e benéfico em escala mundial."
Além dos backgrounds hipocrático, socrático e depressivo à psicologia da cautela,
Hillman acrescenta um quarto pano de fundo: A Beleza.
Diz ele:
" A Beleza pára o movimento, nos arrebata; retemos a respiração,
ficamos surpresos ou maravilhados, espantados ou mesmo aterrorizados
e o mesmo é verdadeiro também com relação à feitura...
A beleza recai sobre nós num relance, nos agarra e solta. O horror faz o mesmo.
A resposta estética é dada com a psique, como um daimon interno acautelador
que nos detém, como o humor depressivo que recusa a ação.
A beleza porém impele à ação...
Isto é, a resposta estética simples conduz ao protesto estético contra a feiura por um lado e,
por outro, ao desejo estético de preservar, proteger e restaurar o belo,
MAS
a beleza, bem como a cautela, não foi feita para ficar quieta...
A beleza só quer que nós detenhamos por um momento o insensato e insensível impulso
para a frente afim de abrir os sentidos ao provocar a resposta estética.
Nossos narizes, assim como nossos olhos e ouvidos
também são instrumentos políticos, protestadores.
Uma resposta estética é uma ação política...
Nos posicionar a favor de nossas respostas,
essas reverberações estéticas da verdade na alma,
pode ser o principal ato cívico do cidadão,
a origem da cautela e do próprio princípio de precaução com seus avisos para
parar, olhar e escutar..."
(James Hillman)
Não sou uma pessoa cautelosa por natureza... muito pelo contrário...
Com o tempo, aprendi sobre os backgrounds hipocrático, socrático
e depressivo numa sociedade maníaca..
Aliás descobri que nossa sociedade é maníaca com Hillman...
As coisas foram se clareando...
Hoje, ainda dou "grandes saltos", porém aprendi que o ditado
NÃO é " Não salte", mas SIM "Olhe antes de saltar.."
E eu olho...
Rosanna Pavesi/Setembro 2015
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